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Gastronomia Croata | Croatia Sacra Paulistana

Gastronomia

Como definir a culinária de um povo tão diversificado, com regiões e climas tão diferentes, capazes de produzir alimentos tão variados? Seriam os peixes do litoral dálmata a grande referência da culinária croata ou seriam as carnes assadas do continente? Ou os doces sofisticados que acompanham o café? Quais pratos ou ingredientes locais ilustram a história da gente e dos costumes? São muitas perguntas, com muitas respostas deliciosas. A mistura de tantos sabores certamente é a principal marca da culinária croata, que funde as influências que passaram no correr da história com o tempero local, assim, muitas vezes o brasileiro dirá isso parece comida alemã ... realmente parece, mas tem outro sabor! Aquilo parece um prato árabe ... realmente parece, mas com outro tempero.

Licitar. Fonte: Wikipedia

Kremšnita, a torta de creme. Fonte: Wikipedia

Os croatas apreciam um café demorado. Um expresso não é tomado no balcão, com pressa, mas é apreciado enquanto se lê jornal ou um bom livro na mesa do café, por tanto tempo que, por aqui, faria o gerente intervir, com rispidez, perguntando se o cliente deseja algo mais. Não, na Croácia não se deseja nada além do sossego, e tempo para apreciar as delícias da confeitaria: štrudle (strudel de maça), pita od jabuka (torta de maça), kremšnita (ou krempita, a torta de creme), Doboš torta (aquela criada pelo Joszef Dobos), além dos vários rocamboles recheados como a makovnjača, recheada de sementes de papoula, ou a orahnjača, recheada com nozes. A lista é grande, sem contar os biscoitos finos com os mais diversos recheios e texturas. O diálogo com a confeitaria austríaca é evidente, afinal a Croácia fez parte do Império Austro-Húngaro. Faz todo sentido demorar no café para provar todas essas delícias cobertas com açúcar de confeiteiro.

Em se tratando de cobertura, é possível encontrar em Zagreb o Licitar, biscoito de gengibre, reconhecido pela UNESCO em 2010 como parte do Patrimônio Cultural Intangível da Humanidade. Depois de assado em formato de coração, o biscoito é recoberto por uma camada vermelha e decorado com motivos espirais ou florais em branco. São oferecidos como presentes em várias ocasiões, como no Dia dos Namorados, ou participam da decoração de Natal, sendo comidos em janeiro. Versões não comestíveis são um popular souvenir encontrado em Zagreb.

Em boa parte da Croácia a entrada das refeições costuma ser uma sopa leve. Segundo as vovós, a sopa ajudaria a preparar o corpo para a refeição. Para os estudiosos modernos, a baka (avó) estaria certa, já que os temperos e ervas apresentam propriedades digestivas. A lista de sopas é longa, com algumas receitas familiares como a canja de galinha, a sopa de legumes ou de carne. Outras receitas são diferentes para o paladar brasileiro, como a sopa de ovo, de tomate ou a sopa de nuvens de semolina (žličnajci od krupice).

As carnes suína, ovina e bovina são muito apreciadas, bem como as aves em geral, sempre com diversos tipos de acompanhamentos. Os detalhes fazem a diferença em cada preparado, como o cordeiro, feito “no rolete” e temperado apenas com sal e alecrim, assando por horas na brasa até ficar macio e ser partido com uma colher. Também há o presunto cru defumado, pršut, preparado nas regiões montanhosas (Dalmatinska Zagora) onde bate a Bura, o poderoso vento, que seca as carnes no inverno exigindo pouca defumação e ressaltando o sabor natural. Eis o mistério das carnes defumadas: os espanhóis apreciam o jamón, os italianos o prosciutto e os croatas têm seu pršut, todos herdeiros da tradição culinária Império Romano. A paixão pelas carnes e embutidos é intensa, como atesta o kulen tipo de “salame” que tem uma receita diferente em praticamente cada aldeia do interior.

A sarma é um charuto de repolho recheado com carne e arroz. A influência otomana é marcante (parece o sarmá armeno ou charuto de repolho árabe), mas o tempero faz toda a diferença: toicinho é adicionado à carne moída para intensificar o sabor e o charuto é cozido no repolho em conserva, intensificando os sabores. Com batatas cozidas e arroz é uma delícia. Seria o meio termo entre o eisbein e o charuto árabe? Por que não colocar o recheio dentro de um pimentão, com bastante páprica?

Sarma. Fonte: Wikipedia

O famoso ćevapčići e seus acompanhamentos. Fonte: Wikipedia

A mesma mistura de influências está presente no ćevapčići (ou ćevape), o bolinho de carne frito na chapa e servido com pão (lepinja), cebolas picadas e ajvar (pasta de pimentão). Quem olha de longe imagina que se trata de uma kafta árabe, mas, sem a hortelã, a carne moída de paleta bovina é misturada ao toicinho, ampliando o sabor dos temperos. Se o bolinho está bem-feito, fica macio e suculento! O sabor é completado pela pasta de pimentão, com sabor encorpado e levemente defumado. Lanchinho rápido e completo.

Voltemos aos acompanhamentos. Existe a versão croata do knödel alemão, a knedle ou okruglice, massa como um nhoque, cozida com temperos. Pode ser salgada, acompanhando as carnes, ou pode ter em seu centro uma ameixa ou morango, servindo de sobremesa. Também a o mlinci, massa parecida com macarrão cujo molho é preparado com as carnes assadas.

Na zona costeira a disponibilidade de peixes faz da Croácia o destino certo para os apreciadores e frutos do mar. Peixes, lulas, camarões, lagostins, polvos, ouriços, e mariscos são ingredientes básicos na vida do litoral, sempre frescos e pescados no Adriático, mar muito limpo e com alta salinidade.

Knedle ou okruglice. Fonte: Wikipedia

Lavanda. Fonte: Wikipedia

O clima mediterrâneo garante produtos exclusivos de alta qualidade, como os vinhos e azeites croatas. A sálvia e a lavanda da Croácia são reconhecidas como as melhores do mundo, graças ao terroir das regiões de cultivo. Mel de alta qualidade é obtido em toda a Croácia, por conta das áreas naturais preservadas. Muitas geleias e compotas são produzidas por toda a Croácia, aproveitando o que a natureza oferece de melhor em cada lugar: figos, ameixas, amêndoas e muito mais.

As uvas são cultivadas por todo o país, com várias uvas autóctones, afinal a cultura vinífera remonta ao Império Romano. Acredita-se que as uvas importantes foram introduzidas por imigrantes croatas no novo mundo, como a carmenere no Chile e a zinfandel nos Estados Unidos. A genealogia da uva primitivo também esbarra na Croácia. Do vinho se destila a rakija, aguardente de gosto pujante, muitas vezes amenizada por ervas aromáticas, dando origem a travarica, que goza da reputação de remédio popular e digestivo, ideal para abrir o apetite junto com um pedaço de pão, pršut e o famoso paški sir (queijo de ovelha da ilha de Pag). Mas se você estiver na Panônia, pode substituir o pršut pelo kulen e a rakija pela šljivovica, a aguardente de ameixa. Quem está com pressa pode fazer um lanchinho rápido, comendo um cevapcici com vinho ou cerveja!

Nos tradicionais almoços e eventos da Croatia Sacra Paulistana é possível encontrar esses sabores, ao mesmo tempo tão parecidos e tão distantes dos nossos. Um toque de culinária caseira sempre acompanhou os eventos, ajudando os imigrantes a matar saudades dos sabores de casa e da infância, mantendo viva a tradição.

Voluntárias: Štefica Pfaf-Carrieri, Marija Begić e Anica Pađen